quarta-feira, 30 de outubro de 2019

O fim da Oficina... - Manguel

Recorte da entrevista de Manguel, ao OBS., pelo lançamento do livro mais recente deste:
E que lugar terão as bibliotecas nesse futuro?

 [...]. A tecnologia de hoje, apesar de aguentar mais memória do que antes, é, ao mesmo tempo, muito negligente na forma como a preserva. À medida que a tecnologia eletrónica muda, existem documentos que se perdem, porque a tecnologia muda tão rapidamente que já não temos os meios para recuperar o que foi colocado num disco rígido há 15 anos, por exemplo. Então temos de ter cuidado com isso. As bibliotecas tentam preservar isso. As bibliotecas preservaram a biografia dos livros. Por exemplo, podemos ver um manuscrito de [Fernando] Pessoa, as palavras rasuradas, as mudanças, como um livro apareceu e como ele depois o corrigiu, o mudou. Isso é a vida do livro. A tecnologia eletrónica acabou com isso. Quando era diretor da Biblioteca Nacional [da Argentina], uma das questões mais difíceis que surgiu era como ter arquivos de jovens escritores, porque poucas pessoas desta geração preservam os vários rascunhos, simplesmente mudam-nos. O rascunho final, o que foi enviado para a impressora, para os amigos, é a única coisa que o arquivo pode ter. As primeiras ideias, as formas de contar a história, as alterações feitas, porque foram feitas, tudo desapareceu. Uma das coisas que tentei fazer foi encontrar um programa que permitisse aos escritores preservarem de forma muito fácil o que mudaram, mas é difícil convencê-los a fazerem isso. Muitos são demasiado preguiçosos, não querem carregar no botão. Do ano 2000 para a frente, as bibliotecas não vão ter os arquivos da literatura que está a ser criada.  [...]